ATENÇÃO: CASO VOCÊ SEJA SENSÍVEL A TEMAS QUE ENVOLVAM VIOLÊNCIA, ESSA HISTÓRIA CONTÉM GATILHOS
Todos os nomes foram trocados para que a identidade da vítima seja mantida em sigilo
POR DANIELA TEIXEIRA
“Se você não fizer direitinho tudo o que seu padrasto pede, nós vamos morar debaixo da ponte.”
Era assim que Maria, a mãe de Melina, coagia a filha, na época com 10 anos de idade, a se ‘deitar’ com Alexandre, seu padrasto, pelo menos duas vezes por semana.
O asco da garotinha pelo homem era tão grande, que toda vez que o padrasto solicitava sua presença no quarto para passar a noite ao seu lado, ela chegava a vomitar e se urinar.
Isso, inclusive, deixava a mãe bastante irritada, já que ela tinha que levar a filha para tomar banho e a ‘preparar’ novamente para o abusador, que esperava impaciente.
“Mãe, por favor, eu não aguento mais. Não me leve para ele hoje”, implorava Melina antes de ser entregue nas mãos daquele ser asqueroso, com quem sua genitora vivia há 4 anos.
Dentro daquelas quatro paredes Melina foi submetida aos piores horrores. Até hoje ela tem crises de choro quando precisa relatar seu passado.
“Tem coisa que não consigo nem contar. É tão absurda que às vezes me pergunto se não é loucura da minha cabeça. Mas eu sei que não. Foi tudo muito real”, afirma.
Melina também destaca que a mãe fazia uma verdadeira lavagem cerebral em sua cabeça, para que ela não apenas se acostumasse com a violência que sofria, como também se mantivesse calada a respeito do assunto na escola.
“Ela vivia falando que era o marido quem pagava todas as contas de casa e que se eu não fizesse aquelas ‘visitas noturnas’ para ele, ele iria nos colocar na rua. E que na rua a vida era muito pior do que aquilo que eu passava em casa”, recorda.
Foram três anos de abusos. Até que Melina chegou ao ponto de tentar tirar a própria vida. “Eu não queria mais passar por aquilo. Qualquer coisa era melhor do que permanecer com aqueles dois. Até morrer.”
O resgate
Foi aí que Tereza, a avó materna, entrou em cena. Ao tomar conhecimento do que a neta tinha feito, ela correu para visitá-la no hospital.
Apesar da distância – a idosa morava em outra cidade -, Melina tinha uma relação de muito amor com a veterana. E foi no abraço dela que a adolescente se sentiu segura para deixar suas emoções fluírem.
Percebendo que algo estava errado com a neta, Tereza, com seu jeito acolhedor, conseguiu fazer com que a jovem, naquela altura com 13 anos, se abrisse. E ela ficou em estado de choque ao descobrir o que sua própria filha e o marido faziam com a garota.
A idosa, então, confrontou Maria e, aos gritos, disse que levaria a adolescente consigo. A mãe de Melina, por sua vez, assegurou que não permitiria que isso acontecesse.
“Aí a minha avó chamou um amigo da família, que era ex-policial. Eu não sei até hoje qual foi a ‘conversa’ que ele teve com minha genitora [não posso chamar aquele ser de mãe] e o monstro do meu padrasto. Só sei que quando tive alta do hospital, fui para casa da vó Tereza”, relata.
O que Melina descobriu anos depois é que o casal de abusadores não apenas aceitou que ela fosse embora, como a mãe também concordou em passar sua guarda oficialmente para Tereza apenas alguns meses após o acontecido.
“Minha avó nunca quis me contar os detalhes, mas acredito que eles tenham feito esse acordo para não serem denunciados à polícia”, cogita.
Vida nova, mas marcada pela dor
Atualmente com 23 anos de idade, Melina ainda divide o mesmo teto com Tereza, de 77 anos, e tem uma vida normal.
“Hoje eu trabalho, estudo, e faço tratamento psicológico.”
Isso porque, ao longo dos anos, a jovem desenvolveu transtornos em virtude de tudo o que passou. “Minha avó me tirou da situação de abuso, mas não soube muito bem como me ajudar mentalmente. Ela me deu muito amor, só que eu também precisava de acompanhamento psicológico.”
Melina arrisca dizer que os transtornos se agravaram pelo fato de o casal que tanto mal lhe causou nunca ter sofrido consequências.
“Os dois seguem casados, tiveram um filho, mas não temos nenhum tipo de contato. Eles vivem a vida alegremente, postando fotos como uma família perfeita nas redes sociais”, conta.
Sem ter conseguido perdoá-los por toda a violência sofrida, Melina ainda mantém a esperança de que ambos pagarão por tudo.
“Eu acho que, em algum momento, a vida vai cobrar o que eles fizeram. E se não cobrar, da justiça divina eu sei que eles não escapam”, encerra.
Caso você ou alguém que você conhece esteja passando ou tenha passado por algo semelhante, não hesite em denunciar. No exterior, procure a delegacia mais próxima ou o consulado brasileiro. No Brasil, use uma das opções abaixo:
Polícia Militar: Ligue 190 – caso a criança esteja correndo risco imediato
Samu: Ligue 192 – caso seja necessário o socorro urgente
Disque 100: Este número recebe denúncias de violações de direitos humanos, feitas de forma anônima
Conselho tutelar: Os conselheiros vão até a casa denunciada e verificam o que está ocorrendo (todas as cidades contam com conselhos tutelares)
Delegacias especializadas no atendimento de crianças ou de mulheres
Qualquer delegacia de polícia
WhatsApp do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos: (61) 99656- 5008