ATENÇÃO: CASO VOCÊ SEJA SENSÍVEL A TEMAS QUE ENVOLVAM VIOLÊNCIA, ESSA HISTÓRIA CONTÉM GATILHOS
Todos os nomes foram trocados para que a identidade da vítima seja mantida em sigilo
POR DANIELA TEIXEIRA
“Muita gente pode me criticar, mas eu preferi não ir pelo caminho mais fácil, que seria a separação, e lutar por meu casamento”
É desta forma que Ângela define sua decisão de perdoar o marido, Gabriel, com quem mantém uma relação de 6 anos, mesmo depois de ter perdido um bebê em virtude da violência dele.
O fato aconteceu em 2020, quando Ângela estava no quarto mês de gestação. Gabriel, mais uma vez, chegou em casa tarde da noite e embriagado. Ao ver que a esposa não se levantou da cama para ir esquentar sua comida e colocá-la no prato, ele se irritou.
“Eu ainda estava meio indisposta por causa da gravidez. Só que como ele estava bêbado, ele ficou um pouco violento. Me tirou da cama pelos cabelos e começou a me xingar”, lembra.
Tentando apaziguar os ânimos, Ângela pediu para que o companheiro parasse com os insultos porque ela iria aquecer sua refeição. Chegou até a pedir desculpas por não ter se levantado logo que o ouviu entrar em casa.
“Só que naquele dia ele estava transtornado. Quando viu que eu tinha feito uma sopa, ele enlouqueceu. Disse que sopa não era comida para um homem que tinha trabalhado o dia inteiro e jogou tudo em mim”, detalha.
Abalada e com os ânimos também à flor da pele por conta da gestação, a mulher caiu no choro e começou a gritar com o marido.
“Eu o xinguei, disse que já estava cansada de ser maltratada, que ele era um bêbado nojento. Quando eu falei isso, ele partiu para cima de mim.”
Ataque violento
Ângela, então, foi atingida com socos, chutes, pontapés e muitos outros insultos. Desesperada, ela gritava: “O bebê, o bebê…”.
Entretanto, nem mesmo a menção ao filho dos dois foi suficiente para impedir o ataque. “Era como se ele estivesse cego, tomado por uma coisa ruim”, avalia.
Segundo ela, porém, a uma certa altura, o marido “despertou”. “Parece que ele acordou de um transe. Quando me viu caída e ensanguentada, ele se ajoelhou do meu lado, começou a chorar e a me pedir perdão.”
Quase que instantaneamente, a vítima sentiu que algo estava errado com seu bebê. “Apesar de estar com o corpo todo machucado, foi uma dor diferente, uma cólica forte, um mal-estar. Eu sabia que estava perdendo meu filho.”
Apesar da surra, foi Gabriel quem a socorreu. “Ele me levou ao hospital. Ele também estava tão desesperado quanto eu.”
A polícia é chamada
A partir daí, Ângela prefere não dar detalhes do ocorrido. A mulher apenas conta que a polícia foi envolvida, mas que ela e o esposo mantiveram a versão de que as lesões em seu corpo foram decorrentes de um assalto violento.
“Eu prefiro nem falar porque sei que vou ser criticada, como sou por quem me conhece e sabe da história, mas não contei a verdade para a polícia e não me arrependo”, garante.
Tudo porque, segundo ela, o parceiro é um homem bom.
“Ele é um homem maravilhoso. Não vou justificar o que ele fez, mas ainda acredito que ele estava tomado de uma coisa ruim.”
Depois de ter seus ferimentos avaliados e cuidados pelos médicos, Ângela recebeu o diagnóstico que já esperava. “Eu perdi meu filho. Eles não conseguiram fazer nada para evitar que isso acontecesse.”
A família dela, por sua vez, ficou sabendo do que tinha ocorrido. “Meu irmão chegou a trocar socos com o meu marido e meus parentes ficaram mais de um ano sem falar com ele, mas eles têm que respeitar a minha decisão. Eu optei por permanecer com o homem que amo.”
Casal segue junto
Agora, três anos após o episódio violento, Ângela afirma que Gabriel nunca mais voltou a beber e que é o mesmo parceiro incrível por quem se apaixonou no início do namoro. “Meu marido é uma pessoa maravilhosa. Ele é carinhoso, cuida de mim e faz de tudo para me ver feliz.”
Questionada se teme voltar a ser vítima de violência doméstica, ela é direta: “Jamais! O que tornava meu marido agressivo é o álcool. E desde aquele dia ele não bebe mais”.
Já sobre a possibilidade de estar em uma relação abusiva e, como muitas vítimas, não conseguir identificar o fato, Ângela chega até a se irritar: “Isso não existe. Eu sou muito amada e respeitada pelo meu companheiro”.
Atualmente, o casal tenta engravidar mais uma vez. Até o momento, no entanto, sem sucesso. “Vamos seguir tentando. Eu sei que uma hora vai acontecer”, assegura.
Por fim, Ângela manda um recado para mulheres que, por ventura, passem por algo semelhante.
“Cada caso é um caso, mas se você sabe que seu marido é um homem de caráter, que perdeu a cabeça por causa de bebida, e acha que ele pode mudar, perdoe! Eu perdoei e hoje sou muito feliz. Perdoar é divino”, encerra.
NOTA: Vale lembrar que o Brasil é o 5º país que mais mata mulheres no mundo. A nação registra um caso de feminicídio a cada seis horas, contabilizando quatro mortes por dia, de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Para contar sua história, mande um e-mail para euvivi@fatosefama.com.br
Caso você ou alguém que você conhece esteja passando ou tenha passado por algo semelhante, não hesite em denunciar. No exterior, procure a delegacia mais próxima ou o consulado brasileiro. No Brasil, use uma das opções abaixo:
Polícia Militar: Ligue 190 – caso a criança esteja correndo risco imediato
Samu: Ligue 192 – caso seja necessário o socorro urgente
Disque 100: Este número recebe denúncias de violações de direitos humanos, feitas de forma anônima
Conselho tutelar: Os conselheiros vão até a casa denunciada e verificam o que está ocorrendo (todas as cidades contam com conselhos tutelares)
Delegacias especializadas no atendimento de crianças ou de mulheres
Qualquer delegacia de polícia
WhatsApp do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos: (61) 99656- 5008